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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Soldados de chumbo

Querid@s,

Antes de sair para a festança de ano-novo, segue o último presente do G1. Infelizmente, não anotei e me deu branco (me ajudem, por favor!!!!) de quem nos trouxe este presente... O poema "Soldado de chumbo", de Serginho Poeta:

Segue também o link para o áudio do poema e um vídeo com a declamação de Serginho no sarau do Binho (o link está ao lado)



SOLDADOS DE CHUMBO

Quando apagam a luz                                                                                            

Da última cela do meu pavilhão                                                                           

Um clarão vem iluminar a minha janela                                                                

É a lua

Não sei o que seria de mim se não fosse ela

O sentinela caminha de um lado para outro

Acende um cigarro...

Um carro passa por trás da muralha

Não posso vê-lo, apenas ouvi-lo

Não posso tocá-lo, mas posso senti-lo


É engraçado

Não fosse pelo andar desengonçado

Pela deselegância

Diria que o homem fardado

Se parece com alguns soldados de chumbo

Que ganhei na minha infância

Minha mãe trabalhava

Por quanto tempo durasse o dia

E acaso, não fosse o bastante

Seu esforço tinha a noite como companhia

Às vezes, me levava para o emprego

E eu ficava confinado à área de serviço

Talvez porque a patroa não gostasse de negros

Circulando pelos cômodos do seu luxuoso cortiço

 

Quando acordava de bom humor

Danava-se a falar do moleque sem cor

Que queria que fosse engenheiro

Sei que minha mãe sonhava pra mim

Um futuro semelhante

Mas quando olhava pro neguinho

Com ar de maloqueiro

Arriava o semblante e sofria

Como quem descobre uma infinita distância

Entre desejo e realidade

 

Certo dia

A madame me deu de esmola

A Guarda Real Britânica

Em formato de miniaturas

Criaturas sem pernas ou braços

Que o pequeno engenheiro enjoou

Eu tinha, lá em casa

Uma tribo com dezenas de caixas de fósforos

Daquelas amarelas

Com a figura de um índio estampado nos rótulos

Vivazes, meus amigos me eram sagrados

E estavam sempre prontos

Para conterem a invasão

Dos soldadinhos amputados

Outros mais me foram dados

Mas minha tribo sempre vencia

Por mais que o pelotão crescesse

Era como se pelo menos ali, naquele dia

O neguinho também vencesse

 

Eu era pequeno, gigante na minha imaginação

Não creio que o fabricante mais astuto

Pudesse imaginar que seu produto

Fosse além de acender cigarro ou fogão


À noite

Quando minha mãe voltava pra casa

Silenciávamo-nos a todo custo

Para velarmos seu sono tão justo

Depois, cada peça do meu invento

Ia para debaixo do colchão

Ao lado do bloco de cimento

Que sustentava minha cama

A dois palmos do chão

Quando Deus achou que era a hora

Resolveu levar minha santa senhora

Antes que ela pudesse perceber

No que a vida me transformou

Se foi ganância, fraqueza ou necessidade

Não sei

Ninguém nunca me explicou

 

Amanhã, é dia de visita

Meu filho, a criança mais bonita

Virá me conhecer

Vou rezar até o amanhecer

Para que a vida também não o torne um bandido

Para que seja talvez como minha mãe sonhou 

Um profissional bem-sucedido

E se acaso eu perceber

Que ainda existe uma infinita distância

Entre desejo e realidade

Maior terá que ser meu pensamento

Mais forte há de ser minha vontade!

 

Abraços fraternos

Giba

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